sexta-feira, 31 de outubro de 2008

Começa o Curta Cinema 2008...

... e, assim como no ano passado, uma equipe de críticos irá cobrir diariamente o festival. Iniciando os trabalhos, um pequeno review do que foi a noite do dia 30/10, sessão de abertura no Odeon:

Nada parece mais apropriado para abrir um festival de cinema que Por Primera Vez. O documentário cubano de 1967 consegue em apenas 9 minutos demonstrar a grandiosidade da sétima arte e o lugar que ela ocupa em uma cultura, a humana, que se ergue fortemente sob os pilares da representação. O filme é capaz de nos sensibilizar com idéias confusas sobre o que é essa coisa, o Cinema, a partir de depoimentos de pessoas que nunca viram um filme. Assim, sinalizando as múltiplas possibilidades do que pode ser uma imagem, vemo-nos em um interessante exercício de pensar o que nos é tão comum em uma sociedade já dominada por códigos visuais e imagens em trânsito. Um convite à reflexão do ordinário e ao questionamento do familiar que marca, como um ritual de iniciação, toda uma nova relação com a imagem - mais consciente e também mais arrebatadora.

A exibição é de 'Tempos Modernos' (Charles Chaplin, 1936). O contraste tradição/modernidade - assunto complicado por si só - ganha aqui, ainda, maior complexidade ao tratar-se de um filme onde precisamente a noção de modernidade é objeto da narrativa: o moderno é o meio e o fim. O que temos, então, são níveis de modernidade que se completam quando nos levamos ao encontro do filme. Quando nos situamos diante da tela grande, temos tantas épocas em jogo que talvez seja impossível não nos reenviarmos às questões iniciais desse texto e perceber o quanto a vida, assim como acontece no cinema, é uma grande estória que contamos a nós mesmos todos os dias.

A sessão segue com Hare Krishna, experimental nada linear, uma tentativa (bem-sucedida) de nos transmitir o êxtase dos anos 60 através do êxtase da imagem. Fluxo; plasticidade; cinema de experiência.

Destaque para Muro que apresenta um muro das lamentações em pleno sertão nordestino. Vencedor do prêmio Regard Neuf na quinzena de realizadores em Cannes 2008, o curta é uma verdadeira obra de arte e, sendo assim, espera pelo espectador para ganhar sentido. As primeiras imagens parecem exatamente definir o lugar de quem vê: elas abusam de linguagem para que não esqueçamos o que está acontecendo - é um olhar, a forma como conteúdo e a serviço da ampliação da percepção humana. Exatamente como nos filmes de Vertov, Muro é para se VER, antes de tudo.


Glauberiano, o filme aponta em diversas direções e uma que me pareceu interessante foi pensar de que forma lidamos com as idéias de avanço e atraso (se é que podemos mesmo pensar nesses termos). Perturbador, incomoda de uma forma que apenas os bons filmes conseguem incomodar. Conceitual, Muro é uma incrível contribuição para o cinema de autor brasileiro contemporâneo.

Next Floor insiste na questão do progresso e, através de uma espécie de competição gastronômica grotesca, nos leva à reflexão sobre tantas outras formas de competição, consumo e abundância que vivemos. É esse o sentido de tudo? Para onde vamos? O olhar final interroga com força e você sabe que estão falando também com você. A fotografia do filme é linda e a direção de arte é maravilhosa.

Alice mostra de que modo uma multidão festiva pode esconder pessoas passando por situações adversas. É um filme sobre como as situações poderiam ter sido ou, então, sobre como elas podem ser diferentes agora. O começo é documental e, apesar de interessantíssimo, pareceu descolado do restante do filme. De qualquer forma, os realizadores conseguiram transmitir um pouco daquela frustração pela qual todo mundo já passou uma vez na vida.

O festival está apenas começando e é DE GRAÇA! Busque os filmes por título (AQUI) e veja quando eles vão passar de novo.

Aproveitem, pois a gente está aproveitando muito!

Diego Madih