Difícil imaginar sobre o que é “Dueto” (“Duet”, Coréia do Sul, 2007) quando o filme começa. A câmera passeia por dentro de um bar, despreocupada em fixar limites para o enquadramento. Sem muito interesse, ela segue uma senhora que serve uma mesa onde está um grupo de jovens. A câmera não volta ao balcão com a senhora, mas fica em volta dos jovens, como se tivesse encontrado ali algo para mostrar. As moças e rapazes conversam, bebem e riem. Não há nada de incomum em seu comportamento e até aquele momento a câmera não destaca um ou outro personagem no grupo. Isto só passa a acontecer com mais uma cena corriqueira: um novo garoto chega no bar para encontrar um amigo que está entre o grupo e uma das moças na mesa se encanta por ele. A câmera abandona o enquadramento aleatório e a moça e o rapaz passam a ser o centro de sua atenção. Ainda assim, o enquadramento não é dos mais clássicos: os planos não recortam perfeitamente ela, ele e os coadjuvantes que interessam na ação; há sempre pedaços de outros corpos (de cabeças, de braços) na imagem.
A moça olha para o rapaz, que a princípio parece não enxergá-la. Seria aquela, então, uma história de amor não correspondido? Essa pergunta perde o sentido quando, a partir da seqüência seguinte, o filme entra num novo ritmo. O grupo de jovens não está mais presente, apenas a moça e o rapaz estão do lado de fora do bar num silêncio incômodo. Os dois estão sozinhos e claramente interessados um no outro, mas não sabem como agir. Os enquadramentos da câmera aumentam a sensação de desconforto e insegurança. Por exemplo, um plano da garota fumando, olhando para frente e não para ele, que está ao lado dela. Há uma certa distância física entre eles, porque, mesmo com o enquadramento aberto da câmera, neste plano somente ela aparece na imagem. Seguem-se um plano parecido dele, com as mãos nos bolsos e olhando para baixo, um plano mais aberto onde aparecem os dois e as imagens vão se sucedendo assim. Quando ele puxa uma conversa, ela mal responde e sai de quadro devagar, atravessando na frente dele. A incapacidade de estabelecerem uma ligação, apesar do desejo à flor da pele, angustia. E nós participamos daquele flerte desajeitado.
Esta relação é desenvolvida de uma maneira tão precisa pela câmera que a situação - afinal, bastante comum - ganha graciosidade e uma certa poesia. O controle que o diretor Ji-yeon Jung tem da mise-en-scène é ainda mais perceptível na seqüência posterior, onde o filme encontra um terceiro ritmo. A moça acha uma alternativa para se expressar, cantando uma letra que traduz tudo o que ela não consegue dizer ao rapaz. Ele a acompanha na canção e o filme se torna, de repente, um musical (como é típico desse gênero, as declarações de amor são cantadas). O dueto quebra o silêncio e através dele o casal consegue se comunicar. É um momento tão adorável que o filme fica completo ali, quando nós entendemos que episódios simples e corriqueiros podem ser muito bonitos.
(Isabella Goulart)
"Dueto" está na Competição Internacional 5.
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