segunda-feira, 29 de outubro de 2007

Michel Gondry


Enquanto a Competitiva Nacional exibida no mesmo dia levantou dúvidas e decepcionou alguns espectadores, uma coisa foi consenso no sábado 27: Michel Gondry é incrível. “Sempre tive o fetiche de ver os curtas do Gondry exibidos no Odeon”, foram as palavras que Fernanda Taddei usou para abrir a sessão. Impossível não compartilhar de tal fetiche. Contador de histórias ou de história nenhuma, Gondry é um mágico, um vanguardista, um romântico, um matemático, um esteta e um inventor. Um cineasta particular que se apropria da experimentação visual das vanguardas do início do século passado e as adapta à sua idéia de arte contemporânea.


Ele olha o mundo em 360 graus. Em suas mãos tudo é incrivelmente complexo – ou, ao contrário, simples? No lugar da unidade há a surpresa – ou a certeza de que podemos esperar um trabalho sempre inventivo, seja ele um curta-metragem, um longa ou um clipe musical? Gondry instiga os nossos instintos, a nossa maneira de perceber e receber a arte visual. Os truques não precisam ser sofisticados. Podem ser tão simples quanto os que seu conterrâneo George Meliès já realizava nos primórdios do cinema, basta apenas que sirvam a seu propósito. Não é a técnica que manda, mas a imaginação à que ela está submetida. Assim, Gondry abre as portas do absurdo e nos leva para outras realidades ou embute a fantasia no mundo real.


Em “Os 24 Anos do Meu Irmão”, um inusitado cartão de aniversário filmado, os cenários gigantes e desproporcionais lembram filmes mudos e expressionistas, por exemplo. “Um Dia” também é um vídeo que precisa de muito pouco para exibir uma criatividade rara. Um homem é perseguido pelo cocô que tenta abandonar: humor simples, estúpido e genial.


Nos clipes, Gondry cria universos tão densos e sincronizados que jamais deixamos de nos impressionar. Para Bjork, inventou narrativas complexas, metafóricas e belíssimas. Em “Around the World”, do Deft Punk Homework, montou um espetáculo de dança futurista com o espírito dos anos 90. Os vídeos para o Chemical Brothers são, para mim, os mais interessantes. O aparente jogo de espelhos que multiplica uma mulher em “Let Forever Be” é, mais que isso, uma permuta entre duas realidades e a composição visual de “Star Guitar” tem um requinte matemático impecável. Cada som da música corresponde a um elemento na paisagem e toda vez que o som é ouvido o elemento se repete, dando à imagem uma complexidade crescente.


Gondry abusa da computação gráfica, das trucagens fáceis ou do raciocínio lógico na construção do plano0 para chegar onde quer. Se eu me pergunto “Como ele fez isso” e descubro a resposta, logo estarei me questionando novamente. O segredo de um artista nato não se limita às suas fórmulas. Gondry é um ilusionista primoroso e poder contemplar seu fluxo de criatividade em tela grande é um prazer.

(Isabella Goulart)


A retrospectiva Michel Gondry será exibida novamente na segunda-feira 29, às 16:00 no Ponto Cine, na terça-feira 30, às 19:30 no Cine Glória e na quarta-feira 31, às 18:00 no Cine Santa.

2 comentários:

  1. De fato, Gondry é um cineasta que impressiona com sua inventividade e dá ao espectador aquela sensação gostosa de estar sendo enganado, iludido pelo seu cinema. Que ele continue nos presentando com mais clipes, curtas ,longas, médias, ou qualquer outra coisa, mesmo!

    Abraços e parabéns aos críticos pelos excelentes textos do blog!

    Vitor Medeiros (Júri Jovem)

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  2. o gondry é o papa da linguagem. tão pessoal que nos faz sentir participante de sua intimidade.

    bom texto!

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